Uma história de ficção:
Num pequeno povoado, onde os adultos entendiam que os acontecimentos da infância, se perdiam no tempo, havia três crianças que estavam sempre juntas. Um menino e duas meninas; tinham 11 anos e eram melhores amigos.
O mais velho deles, Nelson,
tinha uma mãe muito legal que era carinhosa, mas que devido a sua história de
vida temia que o filho fosse mal sucedido. Como estratégia, costumava ficar
muito atenta a tudo que ele fazia e quando ele errava, ela o criticava dizendo:
- Desse jeito você não vai conseguir ser muita coisa na
vida. O mundo não é fácil, meu filho. Preste mais atenção no que faz.
Já na casa de Lourdes,
as coisas eram bem diferentes, os pais não cobravam nada. Não tinha horário
certo para estudar, para dormir. Não tinha deveres a cumprir e não era bem
cuidada. Não recebia qualquer demonstração de carinho.
Íris, vivia de castigo. E aqui para nós,
ela também levava umas palmadas. Morava com a mãe e quatro irmãos mais novos,
meninos bem agitados inclusive. Muitas vezes a mãe a culpava por não ajudar nas
tarefas de casa e no cuidado dos irmãos. Íris sentia-se culpada.
Certo dia as crianças desobedeceram às ordens dos pais e se distanciaram do povoado. Distraídas nem se deram conta que estavam bem distante. Foi aí que Íris encontrou um objeto estranho, feito de metal parecido com uma nave. Curiosos, resolveram entrar e ver do que se tratava. Entraram e ficaram estarrecidos com o que viram. O objeto tinha cadeiras e telas de televisão, parecia um mini cinema. Sentaram e ligaram o play. E logo perceberam que estavam numa máquina do tempo. Cenas das suas vidas futuras se apresentavam ali, diante dos seus olhos assustados.
As primeiras cenas foram as de Nelson:
Com 13 anos tendo sua primeira crise de ansiedade,
minutos antes de fazer uma prova.
Aos 14, vomitando muito na véspera de uma viagem. Com 16
anos sofrendo por não conseguir ter amigos ou se aproximar de uma garota que
ele gostava. Fiquem pasmos! a garota era a Lourdes. Aos 17 anos, passou mal na
prova do ENEM e teve que ser retirado da sala e receber cuidados médicos. A
família ficou bastante triste, porque Nelson não conseguiu concluir as provas.
Na terapia, falou que tinha decepcionado a família.
Em seguida, surge na tela as cenas do futuro de Íris. Ela parecia triste, sentia-se
defeituosa, fracassada, tinha medo de errar... numa passagem, aos 16 anos, ela
era convidada pelo garoto mais incrível da escola para ir com ele a uma festa,
mas ela recusou, isso mesmo! tinha medo de cometer alguma falha, de cair no
meio do salão, de rasgar o vestido... isso fez com que permanecesse a maior
parte do tempo em casa, reclusa no seu quarto. Outro problema apresentado foi
em relação a dificuldade que Íris tinha quando falhava em algum ponto, ficava
péssima. Só porque quebrou um vaso da mãe, chorou durante três dias e teve que
ser medicada para conseguir dormir. A mãe sofria muito com toda situação e
rezava o dia todo.
A tela de Lourdes,
mostrava uma cena na escola quando ela tinha 13 anos, agredindo fisicamente uma
coleguinha. Os pais foram chamados e informados sobre o comportamento agressivo
da filha. A mãe chorava muito.
Na cena seguinte ela parecia depressiva, não queria
comer, não falava com ninguém. Era uma tristeza só. Na sessão com o psiquiatra
queixou-se de estar se sentindo pior.
Estarrecidos os garotos saíram da máquina do tempo e perceberam que haviam saído de uma porta onde estava escrito: “O CAMINHO QUE PODERIA TER SIDO EVITADO”.
Foi aí que perceberam que havia uma porta ao lado, com a
frase: SEM DÚVIDA ESSE FOI O MELHOR CAMINHO. Os garotos não puderam entrar,
porque ouviram vozes lá fora, eram os irmãos de Íris procurando por ela. Mesmo
assim ouviram sons de risos e aplausos saindo daquela porta.
Os meninos não eram mais os mesmos, estavam mais maduros,
mais lúcidos. Quando se aproximaram de suas casas, de longe já viram os pais de
Íris e de Nelson, nervosos.
A mãe de Nelson falou:
- Onde você estava, Nelson Guimarães? Estamos te
procurando há cinco horas. Você deveria está estudando.
- Mãe, fique calma você precisa mudar. Temos que
encontrar outro caminho, se continuarmos assim vamos sofrer muito. Sei que
preciso estudar, mas só tenho 11 anos e quero brincar, outra coisa, pare de
falar em ENEM. Mãe, você pode achar um absurdo, mas eu sei exatamente o que não
devemos fazer.
A mãe de Íris que já estava segurando-a pelo braço,
disse:
- Em casa vamos resolver isso mocinha, você vai ter o que
merece. Íris interviu:
- Mãe, você não ouviu Nelson? Nós também precisamos
encontrar o caminho certo e esse que estamos seguindo é muito ruim, vamos
sofrer muito mãezinha.
Lourdes, vendo tudo aquilo, pega o celular e imediatamente liga para o pai e diz:
- Oi pai, tudo bem? Onde vocês estão? Sabe que eu passei
cinco horas fora de casa? Você não se preocupa? Os pais de Íris e de Nelson
estão aqui querendo saber o que houve. Vocês precisam aprender a cuidar de mim,
a prestar mais atenção no que faço. Pai, se ligue! Precisa cuidar de mim se não
vou ficar com problemas, tomando remédios e não tô falando de aspirinas,
paracetamol... Tô falando de tarja preta. Vamos evitar sofrer lá na frente.
Os pais de Lourdes apareceram para ajudar a filha. Todos foram para as suas casas, estavam exaustos.
No dia seguinte, os três se encontraram e fizeram uma
nova reflexão. Lourdes disse:
- Viu lá Nelson, na máquina, como eu fiquei? Você vive
dizendo, que queria tá no meu lugar, que meus pais são incríveis, não pegam no
meu pé. Pois é, me dei mal no futuro. Acho que o caso mais grave é o meu.
- É verdade, mas meu futuro também não será legal. Tanto estudo pra nada.
- Ei! parem de falar assim. Vocês estão falando como se
tudo que vimos fosse realmente acontecer. Replicou Íris
- Mas se as coisas continuarem como estão, acontecerão
mesmo. Por isso que devemos convencer nossos pais que é importante mudar hoje,
não é Nelson? Eu sei que não vai ser fácil, minha mãe leva uma vida difícil,
trabalha muito por isso eu vivo assim meio solta. Já pensou se ela fosse como a
mãe do Nelson? Coitada, não ia conseguir trabalhar.
- Meninas, vamos insistir nessa mudança. Vou pra casa,
tentar mudar meu futuro desastroso.
- Bem fácil, fazer isso. Brincou Íris.
Lourdes, usou de toda sensatez e falou:
- Não vamos mudar tudo de uma vez, mas aos poucos vamos
conseguindo. Tivemos até sorte de encontrar aquela máquina, pelo menos sabemos
por onde devemos ir.
O que acontece com esses pais? Eles não amam seus filhos? Não se preocupam com o futuro deles? Só pensam em si mesmos?
Acredito que eles possam não ter
aprendido na sua experiência de vida um modo mais adequado de se comportar com
os filhos. Possivelmente não tiveram cuidadores atentos e menos ansiosos, tios
resilientes, professores otimistas e incentivadores...
Mesmo que tenham se sentido em
algum momento incomodados pela forma como foram educados pelos seus cuidadores
ou até mesmo percebam que há algo que não vai bem na forma como educam as
crianças, não se sentem capazes de promover qualquer mudança. Talvez acreditem
que as coisas são do jeito que são e pronto.
A forma como uma criança é tratada, influenciará diretamente naquilo que ela será no futuro.
Quando é elogiada, quando é dito
que ela é inteligente, ela terá grandes chances de se portar como alguém
inteligente. Não achará que algo é tão difícil que não conseguirá aprender. Caso considere alguma coisa
difícil, pensará em como resolver a questão, pensará em soluções, que
ferramentas utilizará, a quem pedirá ajuda. Só não pensará em desistir.
Quando a criança é acolhida, desculpabilizada e orientada no momento que comete algum erro, ela não terá medo de errar; não se sentirá incompetente. Se ela errar, tentará outra vez, entenderá que errar faz parte do repertório humano. Uma criança que teve adultos que tiveram uma forma favorável de ensiná-la a lidar com os próprios erros conseguirá ser mais resiliente diante de uma falha. Pensará que não deve desistir, não se sentirá inferior e seguirá em busca de novas possibilidades.
Jemima Morais Veras
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